Judit Neddermann, no Brasil, entrevistada por Flavio Carvalho.
Brazuca Matraca é o nome de um mítico grupo musical brasileiro em Barcelona. O conheci décadas atrás, no Brasil, apresentado por Manu Chao. O seu líder, Wagner Pa, grande amigo, sempre me trouxe as melhores referências musicais daqui dessa terra, Catalunha. Recentemente, falamos, Wagner e eu, de Judit Neddermann, entre outras grandes novidades musicais, para mim. Adoro escutá-la. Nestes dias, mais.
Acontece que Judit é (faz tempo) uma das mais importantes artistas catalãs. Enche as melhores salas de espetáculo. Já tive a grata oportunidade de assistir um show seu, bem intimista, quando eu nem sonhava ainda em conhecê-la. De duas coisas me lembro. A primeira é de haver gostado bastante da sua personalidade musical: equilibrada; forte e leve, aos extremos. A segunda é que eu desconfiei de algo de Brasil, naquele seu show. Algo nela me levou pra “perto de casa”. Pra nossa sorte, eu estava certo.
Vibrei de alegria quando a Delegada representante do Governo da Catalunha no Brasil, Paula Mèlich (sempre presente no contato direto com a nossa comunidade), a anunciou no grupo Catalães no Brasil. Judit seria a atração da Festa Nacional catalã, La Diada, neste 11 de setembro, no nosso país.
Eu tive a certeza que a Generalitat, o governo autonômico da Catalunha, havia acertado.
Judit agora também é Brasil.
Essa entrevista foi realizada na língua nacional catalã, graças à gentil disponibilidade da artista e da sua companheira de caminhadas, Catalina Rosselló. Judit fala português. Mas, no 11 de setembro, Dia da Catalunha, a entrevistei em catalão. Livremente traduzida por mim mesmo, o entrevistador, para o português do nosso Brasil.
Judit, você pode nos falar um pouco sobre suas viagens fora da Catalunha, por favor?
Sempre gostei de viajar. Isso me abre novas dimensões, em todos os níveis. Em nível profissional, tive a sorte de visitar o Brasil, o México, a Argentina e o Uruguai, para fazer shows pontuais. Por questões pessoais, eu pude visitar o Senegal, Cuba, Costa Rica, a Tailândia, os Estados Unidos, a Índia e vários países da Europa. Em todos os lugares, eu aprendi muitas coisas. Me encanta a diversidade e a humanidade, em geral.
Quais referências e informações você tem sobre o Brasil?
O Brasil sempre foi um lugar presente na minha vida. Quando eu era pequena, meus pais cantavam músicas de Djavan e várias músicas de Bossa Nova. Minha mãe tinha um amigo guitarrista brasileiro, muito querido, que se chamava Euclydes Mattos. Nós o visitávamos, às vezes. Eu o ouvia cantar e tocar, e eu gostava muito. Também, quando comecei a estudar canto com a Anna Català, ela me apresentou à MPB. E, mais tarde, no Taller de Músics (escola de música, em Barcelona), eu cantei muitos clássicos da música brasileira. Então, eu descobri a Maria Gadú e seu disco 'Ao vivo' que me marcou muito. O fato é que eu sempre estive mais ou menos atenta à cena brasileira. Eu adoro a energia e a alegria com que se vive a música, aqui no Brasil. Me conecto muito. Também a maneira de cantar me inspirou bastante, pois é essa forma tranquila e falada, cheia de sentimento, que me ajudou muito a me expressar.
Como foi este verão pra você? Muito trabalho?
Sim. Trabalhamos muito. Também tivemos tempo de descansar e eu gostei muito disso. De poder descansar e poder combinar com o privilégio de trabalhar fazendo shows.
Como explicarias La Diada, o feriado do Dia Nacional da Catalunha, como um sentimento, para quem ainda não conhece a Catalunha?
O 11 de setembro é um dia importante para todas as pessoas que amam a Catalunha. Cada pessoa vive este dia de um jeito diferente. Para mim, a Catalunha é uma terra de acolher bem as pessoas. Um lugar de diversidade e com uma cultura e língua próprias. Este idioma que necessitamos cuidar e compartilhar, ao mesmo tempo em que abraçamos todas as realidades possíveis.
Você, Judit, pode nos falar da sua programação pelo país, Brasil?
Claro que sim, Flavio. Faremos dois shows em São Paulo. E também fiz uma Oficina de Composição Musical na Universidade de São Paulo.
E para quem queira saber dos teus projetos presentes e futuros, para seguir-te, a ti e ao teu trabalho?
Podem me seguir nas redes sociais e também pela Newsletter da minha página na Internet.
Por certo, de onde vens, Judit? Quais são as tuas principais raízes?
Nasci em Barcelona e cresci numa cidade litorânea chamada Vilassar de Mar. Um Pueblo a 30 quilômetros da capital da Catalunha, Barcelona. Dos 19 aos 28 anos eu morei em Barcelona e, agora, faz seis anos que voltei a morar no meu Pueblo, onde me sinto muito à vontade e contente.
Podemos acabar, se estiver bem para você, fazendo as tuas recomendações musicais de cultura catalã, em geral. Tudo aquilo que sirva para uma pessoa brasileira fazer uma imersão cultural no local onde você nasceu.
Os recomendo um disco, um livro e cinema. O disco: Cançons de Rebost, de Mar Pujol. Um livro: Canto jo i la muntanya balla, de Irene Solà. Um filme: Estiu 1993, de Carla Simón.
Agora, sim, uma mensagem final sobre o estado atual do mundo. E sobre os sonhos que você cultiva, cada dia.
Atualmente eu sigo com imensa tristeza o Genocídio que se está cometendo contra o povo palestino. Me custa muito observar o mundo e entender o porquê de estarmos neste ponto que considero muito pouco avançado em nível humano e espiritual. Além de denunciar tudo o que considero injusto e votar sempre nas eleições (na Catalunha o voto não é obrigatório, como no Brasil), o que eu tento é fazer música direto do meu coração. Para trazer momentos de paz e beleza para todo mundo que se conecte com isso e que esteja necessitando. Sinto que é o meu grãozinho de areia. E que, certamente, servirá para alguma coisa. Cada pequena realidade impacta sobre as realidades imediatas. E confio que, pouco a pouco, podemos ir construindo um mundo melhor. Ainda que pareça impossível.
Assim, eu, Flavio, acabei essa entrevista continuando o mesmo livro que já estava lendo (Canto eu e a montanha baila, de Irene Solà), antes que a Judit, por coincidência o indicasse. Junto a isso, coloquei pra tocar um disco autografado do meu grande amigo, o falecido Euclydes Mattos. Músico brasileiro com quem fiz intensa e curta amizade, antes de que ele falecesse repentinamente. Depois de que juntos compartilhamos uma boa apresentação sobre o Brasil daqueles dias, num programa na Catalunya Rádio. Se nós soubéssemos, naquele tempo, escutaríamos juntos, com alegria, um disco de Judit Neddermann.
Aquele abraço. E viva a Catalunha.
Com apoio de www.vida-tour.com @vidatourbrasil
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